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Em Goiânia, número de adoções de crianças e adolescentes triplicou nos últimos dois anos

Número de casos passou de 17 nos anos anteriores da pandemia para 62 entre 2020 e abril de 2022 e inúmeros fatores estão envolvidos

O número de adoções de crianças e adolescentes, em Goiânia, triplicou nos últimos dois anos conforme dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A estatística de 2018 ao início de 2020 mostra que foram feitas 17 adoções na capital neste período. Já entre 2020 e 2022, até o mês de abril, foram 62 crianças adotadas. Fatores como rapidez nos processos jurídicos, desmistificação do tema e diversidade dos perfis de crianças buscadas, contribuíram com o aumento.

A juíza titular do 1º Juizado da Infância e Adolescência, Maria Socorro Afonso e Silva, explica que parte desse aumento foi influenciada pela celeridade dos processos no sistema virtual do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO). A eficácia nos cadastros de habilitação dos pretendentes interessados em adotar e nas movimentações jurídicas, segundo ela, tornou o processo mais prático de ser finalizado.

Maria Socorro reforça que alertas também foram incluídos no sistema para que os juízes cumpram o prazo de 120 dias para finalizar o processo de adoção. “Todas as vezes que está em prazo extrapolado, nós (juízes) recebemos um encaminhamento para concluir”, diz.

O maior acesso ao recurso virtual é proveniente das necessidades de alternativas para o trabalho geradas pela pandemia do Covid-19, além disso, o isolamento foi agente para pretendentes que já pensavam sobre adotar tomassem iniciativa. O contexto pandêmico, segundo a titular, causou “maior sensibilização, as pessoas ficaram mais solidárias e solitárias”, afirma.

Outro fator que contribui para a triplicação do número de crianças e jovens adotados no município é a desmistificação da adoção. A juíza comenta que criar um espaço seguro para que os pais e mães biológicos possam optar pela possibilidade de entregar a criança à adoção é fundamental para que o processo seja saudável e menos crítico.

Perfil das famílias

A diretora executiva do grupo Conviver, ligado à Associação de Apoio à Adoção e à Convivência Familiar de Goiânia (Angaad/GO), Vera Lúcia Cardoso, concorda com a motivação e percebe que a quebra de barreiras e preconceitos das famílias biológicas impulsionou o número de adoções. Desse modo, em especial as mães, não se sentem “desnaturadas” por entregar a criança à adoção.

A diretora executiva do grupo Conviver, ligado à Associação de Apoio à Adoção e à Convivência Familiar de Goiânia (Angaad/GO), Vera Lúcia Cardoso, concorda com a motivação e percebe que a quebra de barreiras e preconceitos das famílias biológicas impulsionou o número de adoções. Desse modo, em especial as mães, não se sentem “desnaturadas” por entregar a criança à adoção.

“Tanto as famílias que procuram adoção estão se ampliando na diversidade, quanto o perfil da criança desejada, os dois estão mudando”, comenta Vera. A diretora observa que a expansão da busca de casais homoafetivos para adotar recebeu um disparo no período dos últimos dois anos e pode ter uma parcela de impacto no número triplicado de crianças adotadas.

Quanto a isso, a juíza Maria concorda. “Antes tinha um perfil bem tradicional, eram casais héteros ou mulheres solteiras. Agora, há muitos casais homossexuais, homens solteiros ou pretendentes divorciados”, diz a magistrada.

Grupos contribuem para encontro

No total, são 140 grupos de apoio à adoção espalhados pelo Brasil. Em Goiânia, destaca-se o Conviver. Lá são oferecidas, para os pretendentes ativos, explicações preparatórias para as etapas jurídicas da habilitação (veja imagem), junto com o amparo durante o processo e acompanhamento psicológico. O grupo continua presente na vida das famílias após a adoção realizando reuniões voltadas a diferentes temas familiares, e criando uma rede de contatos na mesma situação para apoio emocional.

“É muito importante, pois a troca de experiências de outras mães e pais que passam pelo mesmo processo é muito enriquecedor”, comenta uma recém-mãe assistida pelo grupo, Camilla Gonçalves, de 37 anos.

De forma condizente, Paola Roberta Vicente Contiero, que ainda está no aguardo da chegada da sua criança, diz que se unir ao grupo foi “sem sombra de dúvidas a melhor decisão.”

Um dos projetos do Conviver é a ‘Busca Ativa’, elaborado para construir pontes entre famílias e crianças que estão esperando por um novo lar há muito tempo. Constitucionalmente, é uma procura por famílias para adoção de crianças e adolescentes cujas chances de reintegração à família têm reduzidas possibilidades, como, por exemplo, adolescentes, crianças com deficiências e pertencentes a minorias, segundo o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Adoção não deve ser fantasiada, mas celebrada

“Muitos fantasiam a adoção de uma criança perfeita, mas não é assim”, ressalta a contadora Camilla Gonçalves, que ao lado da funcionária pública Mariana Albuquerque, de 38 anos, integra à família o filho de 10 anos, após esperarem na fila desde 2019. “O Juizado da Infância não procura uma criança para as famílias e sim uma família para cada criança”, acrescenta.

Para Camilla, é necessário que os pretendentes se preparem para o fato de que a maior parte das crianças que estão em um abrigo possuem um histórico de negligência e traumas. “É quando ocorrem os atritos que muitas vezes findam na devolução das crianças, aumentando ainda mais os traumas delas.”

Segundo a mãe, a experiência com o filho está sendo satisfatória. “Nossa vida mudou completamente, a casa ficou mais colorida”, conta. Com novas descobertas a cada dia, as mães e o filho fortalecem o vínculo e se adaptam à nova rotina, com atenção à escola, esporte e lazer.

O mesmo é sentido pelo químico industrial, Cristiano Carvalho Martins, de 35 anos. O pai solteiro de um menino de 10 anos, relembra que o desejo pela adoção surgiu quando estava com 20 anos e assim que fez sua habilitação aos 30, se preparou para a chegada da criança.

O período de espera foi importante para que a família de Martins se adaptasse à ideia. Hoje, ele se encontra em um estágio de convivência com o menino.

“Ele sempre diz pai esse é meu maior sonho, é pertencer e ter uma família”, conta. Martins explica, no entanto, que nem sempre é fácil. “A criança deslumbra que vai ter a família perfeita e quando é colocado na realidade você tem que saber conduzir isso”, afirma. O químico acrescenta que mesmo com algumas dificuldades, a vivência é enriquecedora e o filho não tem vergonha da realidade de ter vivido em uma casa de acolhimento e conta sozinho para as pessoas sobre ser adotado.

O pai, que encontrou o grupo Conviver após entrar no processo jurídico e ser habilitado, diz que a temática da adoção precisa ser abordada mais frequente, para criar novas perspectivas.

Fila de espera é longa, mas candidata diz não faltar esperança

Em maio, mês conhecido por celebrar o Dia Nacional da Adoção no dia 25, Paola Roberta Vicente Contiero e Amelya Rezende completarão 2 anos e meio com a habilitação para receberem a tão esperada filha do casal. A vontade de adotar é nutrida por Paola desde nova por conviver com o ato de amor dentro da família, já que seu pai e sua tia são adotivos. “Sempre existiu esse desejo e sempre soube que iria concretizar algum dia”, afirma.

À espera de uma faixa etária disputada, crianças de 0 a 4 anos, e pelo gênero feminino, Paola e Amelya diversificam-se em outras categorias de perfil, são receptivas a doenças tratáveis e qualquer etnia. Ainda assim, o tempo para encontrar a sua filha pode ser longo. “Nós respeitamos o nosso desejo e vontade de Deus, por mais que haja ansiedade e não seja fácil (a espera)”, diz Paola. Ambas estão na terapia para lidarem com a angústia .

“A nossa vida já começou a mudar de forma radical, porque a gente tem ciência que a qualquer momento podemos ser mães, não deixa de ser uma gestação a partir do momento que você é habilitada”, conta. Em relação ao processo judicial de habilitação, Paola explica que não houve nenhum problema para concluir todas as etapas de modo rápido em comparação a outros pretendentes, e recebeu suporte de todo sistema responsável.

Com o intuito de acolher outras famílias que também estão aguardando, Paola criou a conta @adocandonossavida no Instagram e conta que a rede de apoio recebida pela rede social e o amparo encontrado no grupo de apoio Conviver é fundamental para facilitar a espera. O apoio estende para os familiares e amigos das mulheres, que buscam ser espelho para outros casais homoafetivos na espera pela adoção. (Foto: Wesley Costa / O Popular)